sábado, 2 de setembro de 2006

Caos no futebol português

Há uma data de coisas que me incomodam neste caso do caos no futebol.
Para começar, que o que se passou dentro das quatro linhas venha a ser subvertido por decisões de tipo jurídico-formal. Neste caso, o Belenenses (clube muito ligado à minha formação enquanto pessoa – morei muitos anos ao pé do Estádio do Restelo e fui atleta do clube – pelo que com ele tenho uma forte ligação afectiva) perdeu dentro de campo, mas ganhou na secretaria, o que me é antipático sob o ponto de vista ético. Deste ponto de vista, o "culpado" disto tudo é um tal Marcos António, jogador do Gil Vicente (GV) que marcou o golo que deu a vitória sobre o Belenenses na última jornada do campeonato, como escreve Santos Neves em "A Bola" de 4.ª-feira passada. Na mesma linha de raciocínio, Rui Santos, na SIC, nomeia outro "culpado": José Couceiro o qual, segundo ele, tinha equipa para se manter, mas não foi capaz; apesar disso, em vez de punido foi premiado com o lugar de treinador dos sub-21.
No entanto, este há muito que deixou de ser o fundo da questão (desta questão), se é que alguma vez o foi.
O que se passa, começando de trás, é que as particularidades do fenómeno desportivo obrigaram a que este sector se tenha blindado em termos das suas leis internas, não permitindo que os que são seus actores (jogadores, clubes, associações e por aí fora até à multinacional que tudo regula a nível superior: a FIFA) recorram aos tribunais civis para dirimir as questões do seu exclusivo âmbito. Isto é normal, se se pensar que não poderia haver campeonatos caso um jogador a quem foi mostrado um cartão vermelho pudesse levar o assunto para os tribunais comuns e se tivesse de ficar à espera da decisão judicial destes, e seus eventuais recursos (de mais a mais em Portugal). As dúvidas começam logo na dificuldade em definir o que é da estrita competência dos organismos do futebol; e o que não é.
De qualquer modo, e isso compreende-se bem se nos pusermos na sua posição, a FIFA é intransigente quanto a esta questão e, mesmo quando há dúvida sobre se o pode ou não fazer, não está com meias medidas e castiga. A Juventus levou uma bordoada de todo o tamanho e ainda se tentou a recorrer à justiça civil; mas pensou duas vezes e, medindo as consequências, ficou quietinha. De facto, o que lhe aconteceria no imediato era a irradiação, porque the show must go on; e depois, se a decisão dos tribunais comuns lhe fosse favorável, logo a Federação Italiana veria o que fazer.
Este é o pano de fundo do "caso Mateus".
Os juristas dividem-se na interpretação sobre se o assunto "inscrição do jogador" é ou não do foro desportivo. Mas o dever da Federação (FPF) é punir o GV por este ter recorrido aos tribunais comuns. Infelizmente essa punição só agora é decretada, embora eu não tenha a certeza sobre a data em que, através do seu Conselho de Justiça, terá tomado conhecimento oficial de que o GV recorreu aos tribunais comuns. Mas, como o Belenenses apresentou a queixa a 9 de Maio, já teve mais que tempo de se pronunciar, dada a gravidade da situação, da qual só agora parece aperceber-se.
Efectivamente, é este o pé em que se encontra o caso:
Se até dia 15 deste mês a FPF e os outros poderes não conseguirem resolver o caso (nem que seja para depois o mesmo ter de ser reaberto face a decisões judiciais) os prejuízos para o futebol português serão de uma dimensão inacreditável: equipas da Liga dos Campeões e da Taça UEFA arredadas das competições, o mesmo se passando em relação às selecções nacionais (Europeu de Seniores e Esperanças em causa). Isto acarretará prejuízos de muitos milhões para os clubes e para a Federação, além de prejudicar a balança de pagamentos, já que grande parte dessas receitas provém de prémios pagos pelos organismos europeus e mundiais. Além do que isto poderá afectar as próprias carreiras dos atletas envolvidos.
Se tal vier a acontecer será um rombo (tanto em termos financeiros, como desportivos) que levará vários anos a ser ultrapassado.
E não podemos perdoar aos poderes públicos (FPF e Governo) o facto de, como diria José Vilhena, tratarem (?) este assunto "com os pés e a parte de fora da cabeça".

Em próximo artigo tentarei analisar o miserável comportamento da Liga e o comportamento bem português, porque do tipo chico-esperto, dos dirigentes do GV.
Como é que ainda temos de aturar esta cambada?!!