segunda-feira, 20 de novembro de 2006

As vias da justiça desportiva portuguesa

Havia um anúncio na televisão aqui há uns tempos no qual uma personagem (supostamente, a mãe) pedia a uma outra personagem (supostamente, a filha) que lhe explicasse qualquer coisa sobre a internet mais barata. "-Como se eu fosse muito burra!", dizia a actriz.
Pois é isso que eu peço aos gentis leitores do KL: expliquem-me lá então, por favor, como se eu fosse muito burro:
1- Porque é que (soubemos agora), a Liga Portuguesa dos Clubes de Futebol (LPCF) não solicitou aos tribunais a matéria de prova que lhe permitiria instaurar processos disciplinares aos envolvidos no chamado caso "Apito Dourado", apesar de ter sido para isso instada pela respectiva CD. Entre muitos outros, recorde-se, deveria ter sido aberto um processo disciplinar ao major Valentim Loureiro, anterior presidente daquele organismo e actual presidente da respectiva Mesa da Assembleia Geral.
2- Quem vai avaliar e sancionar a conveniente ausência de resposta da Liga? A Liga?!
3- Mas, antes disso, digam-me porque é que é à CD da Liga que cabe actuar nestas matérias, ao mesmo tempo que delibera sobre quem deu a canelada em quem, ou quem não pagou o IRC a tempo? Será legítima uma amplitude tão vasta de competências de actuação?
4- A Liga é uma associação comercial que actua no terreno do desporto profissional. Não deveria ser um orgão fora deste circuito a actuar e avaliar questões de infracção moral ou legal? Poderão rebater esta ideia dizendo-me que a Liga faz parte da FPF... Mas, justamente, porque é a LPCF membro da FPF? Não há conflito de interesses (desportivos, comerciais, morais ou outros...)? E porque é que as “Comissões Disciplinares” funcionam no próprio seio dos organismos que é suposto observarem?
5- Quem pode julgar quem? Quem está acima dos interesses particulares para poder decidir sobre possíveis conflitos ou injustiças? Que normas deverão ser seguidas por princípio?
6- E não é a FPF membro da FIFA...?
7- Porque nos admiramos então tanto por o futebol português andar como anda?
8- E o que diria um cidadão comum que tivesse um conflito com a empresa em que trabalha, por exemplo, e visse esse conflito obrigatoriamente apreciado pelo departamento jurídico da empresa? Ou o que diria a empresa se fosse o departamento jurídico do sindicato a que o cidadão comum pertence por hipótese, a decidir sobre o desfecho desse conflito...? E se, por exemplo, os conflitos entre empresas e cidadãos comuns fossem dirimidos pelos advogados da associação comercial a que eventualmente as empresas pertencessem?
9- E o que dizer, para tornar este panorama ainda mais confuso, de todos estes orgãos travestidos em tribunais serem compostos por juizes de carreira travestidos em juízes de ocasião?
Isto são perguntas de leigo, claro.
Perdoem-me a ignorância e a ingenuidade... mas, expliquem-me lá tudo isto então “como se eu fosse muito burro”...