quinta-feira, 7 de dezembro de 2006

Lamber as feridas e dar a volta por cima

No fim do jogo com o Spartak, três jovens sócios exibiram grandes letreiros do tipo dos que anunciam saldos no supermercado, que diziam: Liedson 0,31€; Paulo Bento 0,00€ e um terceiro que não consegui ver. Todos os circunstantes se opuseram a este tipo de protesto acusando-os de não serem verdadeiros sportinguistas, ao que eles respondiam exibindo os cartões de sócio. No ambiente de enervada e quente frustração que se vivia a oposição aos jovens tomou aspectos de alguma violência, embora não atingindo as pessoas: os cartazes foram-lhes confiscados e rasgados pelas pessoas presentes.
Considero este episódio significativo da actual reacção à triste situação que a equipa vive. Mesmo assim os sócios parecem continuar a dar o benefício da dúvida ao treinador e à equipa. É certo que, um pouco mais tarde nessa mesma noite, no inquérito aos espectadores do Trio de Ataque, a votação sobre quem era o principal culpado da crise desportiva do Sporting teve como "vencedor", com cerca de metade dos votos, o treinador, vindo a seguir os reforços do ano, e só com cerca de 10% a equipa. Sendo, como se sabe, o treinador tradicionalmente o bode expiatório mais imediato e fácil, parece-me mais significativa a votação nos fracos reforços do ano.
Fico contente com isto. De facto, escaldado por aquelas quase duas décadas sem ver o padeiro, mas vendo os treinadores não aquecer o seu lugar, não sou nada favorável à solução da facilidade: almejo uma situação do tipo do Manchester United, em que ao treinador é dado tempo para construir e estabilizar a equipa. E para atingir este escopo já se sabe que se tem de atravessar altos e baixos.
Não podemos ter aquela reacção típica dos adeptos (sobretudo no Sporting) em que os mesmos jogadores e o mesmo treinador que ainda há umas semanas eram bestiais, subitamente passaram a ser umas bestas. E então entretemo-nos a dar tiros nos pés.
Cito Rui Dias (Record): «Em estado de graça, o 4x4x2 em losango foi o sistema que melhor potenciou as características dos jogadores do Sporting – agora, que surgiram recuos inesperados, tira largura ao ataque; quando ganhava, a rotatividade era uma bênção para quem precisa de crescer ou adaptar-se – a perder, é um disparate não pôr sempre os melhores. Paulo Bento viveu o primeiro fracasso da carreira e tem pela frente delicada prova de fogo: lidar com a derrota, resistir aos profetas do instante e prosseguir o caminho vitorioso. O grande treinador define-se em momentos destes».
Eu continuo a achar a táctica boa. O Sporting, sem ter extremos de raiz, atacou sempre muito pelas alas e, descontando estes últimos jogos em que jogámos muito mal, as estatísticas colocavam-no a par do Porto no aspecto dos cruzamentos tirados entre a linha de grande-área e a linha de fundo. No nosso grupo da Liga dos Campeões fomos os que beneficiámos de mais cantos (exceptuado o Spartak que só teve mais 1: 34 para 33). Nesse mesmo grupo, o Sporting foi a equipa com mais posse de bola (53%).
Sem concordar com todas as opções (sobretudo aquela de pôr o Romagnoli e o Bueno de início contra o Benfica), também concordo com a rotatividade, sobretudo tendo em conta o plantel pouco numeroso e jovem do Sporting (23 jogadores, contra, por exemplo, 29 do Benfica).
Por último, na minha leitura o treinador Paulo Bento tem sabido motivar os jogadores e mantê-los sempre disponíveis para dar o concurso à equipa. O descalabro dos últimos jogos deve-se à imaturidade de sectores fundamentais da equipa, cujos rapazes não tiveram capacidade para dar a volta a situações de contrariedade motivadas por golos sofridos prematuramente, em jogos de grande importância. Falhou a força anímica conjuntural, mas o balneário mantém-se coeso.
Em resumo: o único erro grave de Bento foi ter dito que estava contente com o que tinha e não exigia mais. Mas também aqui compreendo que o que ele quis, mais do que dizer que não reivindicaria reforços na abertura do mercado, foi significar uma compreensão pelas dificuldades financeiras do Sporting, que recomendam contenção.
O problema está nos recursos: de orçamento e de plantel. Desenvolverei este ponto em próximo escrito.

3 comentários:

  1. Caro Raúk
    Os erros foram bem mais do que um, e se a rotatividade está bem, é preciso saber fazê-la; e para isso é preciso acertar nos que se contratam; como se vê, paredes e Custódio nãos ervem para trinco (actualmente o melhor que o SCP tem para isso nem é o Veloso, é o Moutinho) e Polga não da nenhuma segurança (já que Ricardo tem de jogar, que entre um central seguro, mas esse passaram sem ele depois de mais uma novela no Verão).
    Dar a volta por cia envolveria obter respostas para perguntas simples, como as que já era possível fazer em Agosto.
    Cá espero pela continuação, mas sobre as dificuldades financeiras, elas derivam de incompetência: há 10 anos que são os mesmos tipos que dirijem o clube sem transparência nenhuma e com casos constantes: JV Pinto, Moisés, Enakarire, lugares para os cegos, relva do estádio (que dura há anos!), alheamento da Liga, jogadores vendidos barato e demasiado cedo, dança de cadeiras na direcção e falta de enquadramento a treinadores e jogadores. Isto não são questões de orçamento, mas de competência e seriedade. Muito mais grave que os palermas os cartazes é o pequeno grupo que se coopta na direcção há 10 anos e que já nos deus luminárias como Santana e Dias da Cunha a presidentes...
    Mas concordo, a solução ideal será tip Manchester - por alar nisso, não se assinou um protocolo relativo a jogadores quando o Ronaldo foi para lá?
    Cumprimentos

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  2. Penso que o cansaço e as lesões de jogadores chave também foram decisivos.

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  3. Caro Carlos Leone,
    O que me preocupa agora é o curto prazo. Esou farto de ver crises transformarem-se em tragédias por via de paixões exacerbadas em tempo de crise. Acredito que, se a pressão não for excessiva, a equipa que está, com uns reforços, pode chegar à Europa para a próxima época. Elejo esse como objectivo actual. Em tempo de guerra não se limpam as armas (e muito menos se deve dar tiros nos pés).
    Saudações leoninas

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