segunda-feira, 15 de janeiro de 2007

O meio-campo e a disciplina

Volto a dizer que uma das virtudes que reconheço à gestão de Paulo Bento é ter transformado uma equipa com graves problemas disciplinares, numa equipa disciplinada. É claro que não há unanimidade; até é bom que haja pluralismo, desde que não haja dúvidas sobre quem é que tem a última palavra. E também é natural que possa haver actos individuais de indisciplina.
É o que parece ter acontecido com Nani: ao que se diz, ter-se-á desentendido com Custódio, sendo este, como se sabe, o capitão de equipa.
Recorde-se aqui o que PB disse sobre Nani na entrevista de fundo de há uns meses a “O Jogo”:
«… é bom que aprenda a saber conviver com situações de sucesso. Mas para este menor rendimento que ele tem demonstrado há alguns culpados: em primeiro lugar eu, porque se calhar coloquei-o a jogar vezes demais; em segundo lugar ele, porque não está a aproveitar todas essas oportunidades da melhor maneira; e depois, se calhar, quem o rodeia, muitas vezes quem lhe possa dar demasiadas coisas para quem alcançou tão pouco. Isso torna-se perigoso para um rapaz de 20 anos. Ver notas 7 e 8 só por fazer um golo torna-se perigoso para um jogador…»
Pois, se calhar PB pôs Nani a jogar vezes de mais. E desta vez resolveu pô-lo na ordem e não o convocou.
Pelo contrário, passado o seu período de quarentena, PB resolveu-se a meter Carlos Martins nas opções iniciais. As consequências foram altamente penalizantes para a equipa: ao mau jogo de CM (como o tem feito ultimamente, a fazer um jogo à parte) somou-se o primeiro dia não de Moutinho ao fim de oitenta e tal jogos seguidos a titular, e o Sporting ficou sem ninguém que pegasse no jogo durante toda a primeira parte. A equipa “sentiu” que não podia contar com a sua linha média e os centrais começaram a despejar bolas por cima dessa linha, directamente para os avançados. Ou melhor, para Liedson, porque Alecsandro não existiu e Djaló entrou mal no jogo e o seu processo de afirmação está a ser lento.
Quem critica estas opções não pensa na composição subjectiva do “balneário”.
O futebol de top é um negócio de alto risco. A sua matéria-prima são jovens (no caso do Sporting, muitos são mesmo muito jovens), a quem, pela sua expertise são pagos salários muito acima do comum, e à volta dos quais se movimentam, por via da fama e do dinheiro que têm, tentações de todas as ordens, muitas incompatíveis com as exigências da profissão.
É bem certo que tem havido alguns progressos no que respeita ao grau de iliteracia dos jogadores de futebol. E também neste, como noutros casos, não se pode generalizar. Mas, falando dos de topo, vejo o futebolista padrão como um tipo cuja meninice se passou em ambientes próximos da pobreza e que, acedendo a uma pipa de massa mensal no fim da adolescência, procura afirmar a sua rebeldia, a sua diferença, através da afirmação do poder de compra adquirido. A coisa traduz-se nos penteados à futebolista, no uso de roupa (no dia a dia, casualwear, tipo esfarrapada, mas com design D&G; em ocasiões especiais a camisa YSL e o fato Armani sem bandas) comprada directamente nas passagens de moda e adereços de marca: o Breitling, ou o Rolex, o discreto brinco de platina com pedra preciosa, os Reyban. Cada vez que sai à rua um futebolista de topo leva no corpo o equivalente a um ano de salário médio e desloca-se numa bomba de valor equivalente a quase toda uma vida de trabalho paga ao salário mínimo. É à volta disto e da playstation que se centram os seus interesses quotidianos.
Um treinador que tem de conviver com estes seus subordinados, a maior parte dos quais com ordenados muito superiores ao seu, tem de impor uma disciplina rígida. E não pode manter uma relação de proximidade afectiva; tem de guardar distância. Assim se justificam as afirmações de Paulo Bento no final da partida com o Belenenses, sobre a ausência de Nani da lista de convocados:
«O que digo é que elogiamos demasiado os jogadores, ou pelo menos alguns jogadores que ainda fizeram pouco. Têm de fazer mais. Jamais vou pôr os interesses individuais de alguém à frente dos interesses da equipa. Os interesses da equipa foram salvaguardados ao não convocar o Nani.»
Por outro lado, sobre Carlos Martins, afirma: «As conversas que devo ter, tenho-as no lugar certo e no momento adequado, sobre coisas que logicamente não podem acontecer».
Em resumo, quanto à questão da gestão disciplinar estou com Paulo Bento.
P.S.: quanto à má prestação da equipa contra o Belenenses, ela não encontra justificação apenas na arriscada dependência dos jovens; há também a considerar a mediocridade dos “reforços” deste ano (também Farnerud e Alecsandro nada contribuíram para o bom jogo da equipa). Sobre isto tenho eu suficientemente escrito, verberando a qualidade das contratações feitas e pugnando por soluções. Que parece não estarem a ser tratadas durante esta reabertura do mercado…

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