segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Objectivos

O Sporting lá venceu mais uma etapa desta fase que podemos chamar de "Objectivos B", objectivos, recorde-se, definidos reactivamente depois da nau ter andado à deriva durante largo tempo. Na quarta-feira espera-nos um novo desafio. Vamos ver como vai ser cumprido e esperemos que o Sporting esteja à altura dos seus pergaminhos.
Enquanto o Sporting luta por cumprir estes objectivos B, chegam notícias (já largamente divulgadas e discutidas nos meios de informação e em diversos blogs) de que os grandes clubes ingleses de futebol se preparam para "exportar" a Premier League. Não tenho dúvidas que este figurino vai pegar e que se irá mesmo espalhar. O futuro da bola adivinha-se diferente. Nada que não se pudesse, de resto, prever há muito.
Pelo que se pode desde já concluir, face a este novo figurino e numa observação preliminar, as reacções ir-se-ão por certo dividir. Os entusiastas do desporto espetáculo exultam com o novo cenário. Os adeptos actuais dos clubes que se preparam para entrar nesta nova era do futebol espetáculo olham para tudo isto incrédulos e interrogam-se.
Mas, a nave move-se, indiferente...
Esta tentativa de transformar o futebol numa coisa tipo NBA ou NHL e a sua exportação já vêm de longe. A entrada dos grandes capitalistas americanos no futebol inglês e da consequente "empresarialização" do futebol devem ter acelerado o processo. Podemos esperar que se a história futura da bola for por aqui haverá uma reacção noutros países com Ligas fortes e clubes de primeiro plano. Que estarão já, certamente, a fazer as suas contas e a planear já o seu futuro.
Podemos imaginar facilmente duas consequências de tudo isto.
Os clubes ingleses irão, por um lado, ganhar decerto muitos novos adeptos em Singapura, nos Estados Unidos, no Japão, etc. O futebol vai ganhar um novo ímpeto. A fasquia vai-se elevar, os orçamentos, as remunerações dos jogadores, os valores das receitas vão saltar para níveis que utrapassarão muito aqueles que já hoje nos fazem abrir os olhos de espanto. Não parece suscitar dúvidas a ninguém que o futebol vai entrar generalizadamente numa nova era feita de fidelidades geradas em grandes operações de marketing. O novo "adepto" que se está forjar é um adepto de plástico, superficial e volúvel, de uma fidelidade volátil que se (co)moverá ao sabor das promoções...
Os adeptos tradicionais, por seu lado, não podem deixar de olhar para tudo isto com alguma ansiedade. O que vai querer dizer "ser adepto" de um clube daqui a uns anos? Com base em que valores se vai alicerçar esta nova relação entre os adeptos e os novos "clubes-espetáculo"? O que vai ser dos adeptos dos clubes da "velha guarda"? Como se irão integrar nesta nova ordem do futebol espetáculo?
Adivinha-se facilmente vários tipos possíveis de reacção. Uns entrarão sem grandes hesitações nessa nova ordem. Mas, outros optarão por "descer" juntando-se a clubes mais pequenos, ou escolhendo novas formas de organização que se vão multiplicar (novos clubes forjados na dissidência dos antigos clubes, organizações de adeptos fora do âmbito dos clubes, etc.) Outros, ainda, desistirão simplesmente da bola. Uma coisa me parece certa: ninguém vai poder abster-se de tomar uma atitude.
Face a tudo isto temos de colocar a pergunta inevitável: o que vai ser do Sporting no quadro desta nova realidade que parece incontornável? Que futuro para o Sporting? Como está o Sporting a preparar-se para as mudanças que aí vêm? Que trunfos tem o Sporting nesta nova ordem clubística que se antecipa? E quais são, sobretudo, as suas fragilidades? Que modificações irá esta nova ordem introduzir numa instituição como o Sporting? De que forma se reflecte tudo isto no presente e de que forma se irá reflectir no futuro da organização do Clube? Conseguem os Sportinguistas vislumbrar alguma estratégia para lidar com tudo isto? Estarão os Sportinguistas conscientes destas novas realidades que aí vêm?
Enquanto se prepara para cumprir mais uma etapa desta fase "Objectivos B" (desportivos e de gestão), que se espera que seja ultrapassada com êxito, e se diverte à procura do bufo, o Sporting está confrontado com um desafio para o qual me parece não estar de todo preparado. Estarão os Sportinguistas conscientes da inevitabilidade de estabelecer, de forma sustentada e com alcance verdadeiro, uns "Objectivos A" para o Clube?
Que cenário para o futuro do SCP do século XXI?

7 comentários:

  1. Há um ou dois pontos a este respeito que merecem uma discussão mais alargada, porque reflectem debates que já se desenrolam no interior do próprio Sporting. Por um lado, temos aqueles que mesmo sendo contra a gestão Soares Franco não são contra esta formas de gestão mercantil do clube e é nelas que revêem o seu futuro. Esses estão convictos não só de que o Sporting pode concorrer num mercado futebolístico global como também de que esse modelo vai-lhes ser benéfico. Outros, nos quais me incluo, pensam que um clube sem uma base social de apoio e que não sirva para mais nada aos seus sócios/fãs/adeptos sem ser para consumir uma parte do rendimento mensal e distrair durante uma parte do tempo de lazer de pouco ou nada serve. Nesse caso, prefiro ir ao cinema ou qualquer coisa do género.
    Do que não nos podemos esquecer é que este projecto de criar ligas fechadas globais não surge no vácuo e que sem a história e a "mística" dos clubes, que também estão a ser alvo de takeovers, esse produto de nada vale. O caso das camisolas do Manchester este fim-de-semana é ilustrativo disso. O adepto desterritorializado, displicente e desengajado do futebol congelado (o consumidor do espectáculo desportivo) também compra a história e as conotações identitárias do produto. Sem essa dimensão distintiva o produto perece. É nesse terreno que lutamos e a potencial desafiliação do adepto "tradicional" pode ter algum impacto.
    Agora de forma mais directa. Já estive mais longe de me tornar sócio do Odivelas ou do Atlético. Mau futebol já temos. Preços baixos e convívio saudável é que vamos tendo cada vez menos.

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  2. Observações correctas nas quais me revejo. Já há que tempos que abordei estas questões aqui a propósito do F. C. Manchester.
    O perigo de uma visão puramente mercantilista do Sporting é o de poder levar o Clube a uma ruína definitiva. Nem a pensar simplesmente na "bola na trave" nos aguentámos, quanto mais se ainda levarmos o Sporting para esses terrenos. Por outro lado, é certo que o Sporting precisa de estar preparado para o que aí vem.
    Ora aqui está um debate sério, necessário e aglutinador.
    Que terá de ser feito sem demagogias, com enorme seriedade e tendo em conta que uma palavra errada pode disparar a mina... Há mais gente a ansiar pelo Olivais e pelo Atlético que os baronetes sportinguistas pensam.
    Ora aqui está também um ponto importante para a agenda de um futuro candidato à presidência do SCP. O programa de candidatura passa sobretudo por estas questões...

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  3. Esta é de facto a discussão que é preciso travar e penso que mesmo aqueles que se opõem ao actual regime ainda estão longe de conseguir pensar um projecto para o Sporting que tenha em conta não somente a dicotomia associação/empresa ( e mesmo essa não é considerada por muitos) mas também as transformações estruturais que vamos observando no futebol mundial. A deslocalização das competições, a redistribuição das mais valias, os grupos sociais (tanto em temos de classe mas também a partir de critérios como bancadavsofá, etc) que cada clube e cada competição acomoda, a própria finalidade da competição desportiva (pense-se nos processos de concentração vertical e horizontal que vamos observando com os mesmo grupos de pessoas a controlarem fundos de jogadores, clubes em diferentes países, meios de comunicação social, etc, etc...) entre muitos outros factores. O que não precisamos mesmo de discutir nesta altura, sem ser nas roulotes, nos cafés e nas bancadas é a bufaria, o defesa esquerdo e até mesmo a ânsia imediata por títulos. Como alguém escreveu uma aqui aqui no King Lizards: Projecto precisa-se.

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  4. Cuidado Luizinho que eu já aqui me vi criticado por também achar que "O que não precisamos mesmo de discutir nesta altura, sem ser nas roulotes, nos cafés e nas bancadas é a bufaria, o defesa esquerdo e até mesmo a ânsia imediata por títulos." :-)
    São assuntos que é preciso agarrar com pinças. É que isto ao mínimo sinal de vitória a malta esquece-se logo da crise...

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  5. Pois é. Essa é uma que ainda tenho entalada. O modo como Soares Franco manobrou a Assembleia-Geral do Pavilhão Atlântico com um powerpoint em que, depois de se ter arrasado o ecletismo do clube, se mostrava como o Sporting conquistou mais títulos do que o Benfica nas diversas modalidades e nos escalões de formação do futebol foi de facto inacreditável. Ainda hoje tenho pesadelos com o dito evento e penso que é na ânsia de vitória e de superioridade em relação ao próximo (relevadora de maiores índices de provincianismo e pataqueirismo quanto mais próximo for o próximo) que se pode explicar a derrota/vitória de Soares Franco naquele dia. Obviamente que ninguém corre para perder, mas esta ânsia de vitórias é algo que não me surpreendendo não deixa de causar alguma espécie. Parecem burros atrás da cenoura...

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  6. Já agora eu também não me esqueço que nessa AG o senhor presidente defendeu a teoria que para se ser do Sporting é preciso ter alguma disponibilidade financeira... Eu por mim, quando ouvi essa, acendi logo o meu charuto (caríssimo!!), o terceiro da noite, com uma nota de 500 € que trago sempre na carteira para o caso de se me acabarem os fósforos. E sorri, satisfeito. Estava entre os meus...

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  7. A questão dos adeptos é mesmo fundamental para o Sporting em que estou interessado. Mesmo (ou sobretudo) nos países em que o capitalismo no futebol adquiriu as suas formas mais "avançadas" (como a Inglaterra, com os clubes a serem comprados por magnatas) os adeptos encaram novas formas de afirmação. Para não falar nos próprios poderes públicos; o ministro que tem o pelouro do futebol (Secretary of State for Culture, Media and Sport) afirmou: "Quero ver um representante dos adeptos, uma voz dos fãs, no executivo – no executivo principal – de todos os clubes profissionais".
    Talvez esta seja, para já, uma das reivindicações em que urge começar a pensar.

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