sexta-feira, 23 de dezembro de 2005

Que futuro?

Chegámos ao fim da primeira volta do Campeonato 2005-2006 e estamos às portas do novo ano. Aproximam-se inevitáveis tempos de mudança e é talvez o momento de fazer um pré-balanço e uma pequena perspectiva de futuro.
Devo confessar que estou pessimista quanto ao futuro global do futebol no nosso país e extremamente descrente da capacidade do Sporting, em particular, para dar a volta ao texto.
Como referi em post anterior, esta minha opinião radica em dois factos, o tal problema duplo como lhe chamei. Por um lado, o SCP não emite sinais de saúde e não se adivinham soluções credíveis para alterar este estado de coisas. Por outro lado, o futebol português bateu no fundo e todos o os seus agentes e actores estão, na minha opinião, em verdadeiro perigo de extinção.
Tenho algum receio de estar a cair numa visão demasiado catastrofista, mas a verdade é que o não vejo grandes saídas, nem ninguém me conseguiu ainda provar o contrário de forma insofismável.
Desde logo porque a situação do país não é de molde a permitir a recuperação de uma área que parece só funcionar bem com a ajuda de balões externos de oxigénio. Há de facto coisas bem mais importantes na nossa agenda colectiva. Ou não?!
Por outro lado, o futebol é um espectáculo caro que não parece ter neste momento mercado que o sustente. Por outro lado ainda, os clubes estão, creio que de uma forma generalizada, a atravessar uma crise dramática. Finalmente, o futebol sofreu transformações mais ou menos recentes no nosso país que, se não me engano, lhe inflingiram feridas fatais.
Quanto à situação do país não parece haver grandes dúvidas. O grande problema não radica, creio, na ausência de mecanismos e recursos para enfrentar as dificuldades, mas na lentidão da resposta dos portugueses ao desafio de pegar este touro pelos cornos, nas suas hesitações, preconceitos e mal-formações congénitas. O futebol poderia ter neste contexto um valor estratégico interessante. Esta era a visão de José Roquette e de outros (raros) dirigentes que passaram pelo Sporting nestes últimos tempos de modo fugaz. Mas, infelizmente, esta ideia foi desenvolvida num contexto errado ou desadequado: emanou de um clube --o Sporting--, sem um esforço coerente de procura de uma convergência estratégica com os outros clubes e com as estruturas de coordenação da economia e do desporto nacional.
Entretanto, o futebol consumiu, tal como os ursos em período de hibernação, as suas gorduras. Depois de despertar do seu turpor e enfrentando a dificuldade de ter de encontrar alimento, o futebol português não parece ter capacidade para reagir e mudar o curso deste declínio contínuo em que mergulhou desde há anos. Não é preciso grandes análises: os clubes estão falidos, o fenómeno dos ordenados em atraso e as consequentes ameaças de rescisão colectiva, tornaram-se quase moda, o fim do futebol profissional foi a solução em muitos casos para a crise, as ameaças de execuções fiscais cairam sobre os clubes de uma forma que os deixa sem qualquer margem de manobra. Nada disto é ficção. São situações que têm sido amplamente retratadas, reais, acontecem aqui e agora, como se costuma dizer.
Finalmente, o futebol hoje o que é? Onde estão os valores que inspiram os clubes? Quem veste a camisola (no sentido literal e metafórico do termo...)? Quem são os donos dos clubes? Os sócios, os accionistas das Sad’s, as direcções? Por que razão os adeptos e sócios pagam fortunas para assistir a um espetáculo decadente em estádios às moscas? Quem são os destinatários das receitas geradas pelo espetáculo do futebol? Que destino é dado às receitas dos contratos de televisão, do merchandising, da publicidade, do aluguer dos nomes dos estádios, das portas, dos centros de estágio? Não estaremos nós a suportar custos que nada têm a ver com os protagonistas principais (jogadores, técnicos de um lado e adeptos dos outro) da cadeia que compõe na essência o fenómeno futebolístico? Por outras palavras, não estaremos nós a pagar afinal a um grupo de intermediários que nos custam um balúrdio e só servem, na realidade, para encarecer este produto que todos gostaríamos de consumir, mas que cada vez parece de menor qualidade e mais inacessível (um fenómeno comercial bizarro)? Que mais-valia palpável trazem estes intermediários ao produto, que permita nomeadamente reagir à crise instalada? Não seria mais sensato, por exemplo, termos um modelo de estruturas futebolísticas do qual desaparecessem os intermediários, que baixasse os custos de exploração para valores que permitissem a venda do produto a valores mais realistas? Porque decresce a procura? Clubes de jogadores e técnicos, em vez de clubes de dirigentes, por exemplo, cooperativas de sócios, jogadores e técnicos, poderia ser a solução... Quem não gostaria de pertencer a um clube gerido e protagonizado pelos ídolos da bola?
Como não vislumbro a possibilidade de grandes alterações deste status quo, como não vejo vontade, nem capacidade para mudar radicalmente uma situação que necessita de modificações radicais e inovadoras, presumo que as coisas se irão deteriorar até a um ponto de não retorno... Há pouco tempo li, não me recordo exactamente onde (peço desculpa pela omissão da autoria) um post onde se recordava que o futebol de alta competição na Suiça ou na Hungria (países com tradição futebolística) passou por dificuldades semelhantes às que nós vimos experimentando até praticamente se extinguir. Em Portugal também me parece estar eminente uma situação deste tipo, a não ser que sejam dados, de forma muito determinada, os passos certos. Coisa que ninguém parece estar interessado em fazer...
O Sporting teria tudo para constituir um farol no meio de todo este caos. Digo-o com absoluta convicção. Já ouvi gente ligada ao Sporting colocar o dedo exactamente na ferida. Atenção: não nos outros clubes. No Sporting...!
Não o será nunca contudo com esta direcção, nem com protagonistas oriundos da sua área de influência. Viu-se já que quaisquer alterações profundas passam pelo seu afastamento, embora também não se vislumbrem para já alternativas. Por outro lado, as novas soluções estratégicas têm de envolver inevitavelmente e de forma coerente toda a estrutura do futebol português e o Estado (esta questão tem falhado de forma estrondosa, como disse). Liderar portanto este processo implica visão estratégica, sentido de independência, autoridade inequívoca e, sobretudo, uma grande coragem para que à mínima dificuldade não ocorra o que tem acontecido: retirada prematura antes de os resultados estarem consolidados.
Não se avizinham, pois, na minha opinião tempos muito risonhos para o futebol portugês (a Selecção acaba por ser uma excepção coerente com esta lógica que descrevi), nem, consequentemente, para o Sporting. O futuro não me parece brilhante...