terça-feira, 5 de junho de 2007

A venda de Nani: um bom negócio


Para encetarmos a discussão sobre se a venda de Nani foi ou não um bom negócio debrucemo-nos em primeiro lugar sobre as regras do jogo, isto é, as leis do mercado. Os contratos entre os clubes e os jogadores são feitos com o estabelecimento de um salário, o montante duma cláusula de rescisão, e um período de validade. Em princípio o salário é tanto maior quanto o montante da cláusula de rescisão e esta existe na tentativa de blindar a venda do jogador em causa até esse montante. Uma promessa de não vender tem, pois, de ser entendida como uma não colocação do jogador no mercado, isto é, a não tomada de uma atitude pró-activa no sentido dessa venda. Num caso em que isto aconteça, a primeira consequência será a de que não haverá lugar ao pagamento de qualquer comissão na venda por parte do clube vendedor, pois não demonstra interesse na venda. Mas, como é óbvio, havendo quem cubra o montante da cláusula de rescisão, e havendo acordo do jogador, não há nada a fazer se não vender.
A venda de Nani constituiu o negócio mais vultoso de sempre envolvendo jogadores do Sporting. Foi vendido por muito mais dinheiro do que Cristiano Ronaldo. Sendo a cláusula de rescisão de 20 milhões, o jogador foi vendido por mais 5,5 milhões. Estes factos só por si, deveriam acabar com a discussão; mas como não acabaram, analisemos o resto.
Nas contas comparativas com a venda de Anderson pelo Porto, não restam dúvidas de que saímos a ganhar. Assim, e segundo o Record de 1/6, dos 30 milhões que o MU deu por Anderson, 6 foram para a Gestifute e, tendo o Porto investido 8,5 no jogador, o lucro bruto foi de 15,5 milhões; dos 25,5 milhões que o MU deu por Nani só 5% foram para o Real Massamá, sendo 24,225 milhões o lucro bruto do Sporting.
Aqui não estão considerados os custos de formação de Nani na Academia do Sporting, portanto passemos a analisá-los. O moço entrou para a Academia aos 15 anos, vindo do Real de Massamá. Portanto esteve lá em formação durante 2 anos. Os outros 2, até hoje, foram passados com a equipa principal, onde ele vencia um ordenado (cerca de 11 mil euros) que era dos mais baixos do plantel: recebia, por exemplo, menos cerca de 23 mil euros por mês que Farnerud e jogou dez vezes mais tempo no campeonato. O ordenado de Nani só era possível por ele vir da formação interna; é sabido que os jogadores vindos dos juniores ficam a ganhar um ordenado impossível de dar a qualquer futebolista que tenha vindo de outra equipa (como o exemplo de Farnerud confirma). Por estas contas, mesmo que a formação de Nani tivesse custado o balúrdio de 23 mil euros por mês nos dois anos que durou, esses teriam sido compensados pelo que o rapaz não ganhou nos dois anos em que esteve com o primeiro team. Nesta lógica nada haveria a deduzir. Mas as contas reais serão fáceis de fazer recorrendo aos prejuízos declarados da Academia (elementos a que agora não tenho acesso). Imaginando que a Academia deu um prejuízo de 5 milhões de euros (número propositadamente exagerado) durante as épocas em que Nani lá foi formado, mesmo dividindo este montante pelos 5 jogadores dessa fornada de formação que esta época fizeram parte da primeira equipa, a formação de Nani teria custado 1 milhão de euros. Logo o lucro teria sido de 23,225 milhões, muito mais que o que o Porto ganhou com Anderson e do que o Sporting ganhou com Cristiano.
Fazendo um parêntesis sobre a gestão da Academia, sempre devo dizer que esta tem receitas próprias e, como projecto de gestão, não faz sentido que apresente prejuízos; se apresenta, não devia apresentar, se a gestão fosse como devia. Além das receitas dos torneios de captação e dos estágios remunerados, a Academia devia receber uma espécie de “transferência” dos jogadores que se afirmam na equipa principal, ou uma percentagem das efectivas transferências destes para outros clubes; assim seria obrigatório que a Academia tivesse autonomia financeira, se auto-sustentasse e não fosse um encargo para o clube. Se, por exemplo e para facilitar, neste caso tivesse havido uma percentagem a título de formação a receber pela Academia igual à que recebeu o Massamá, estaríamos a falar de 1.775.000 euros e o lucro da venda de Nani teria sido de 22,5 milhões de euros.
Para terminar poderíamos ver quais seriam as alternativas a esta venda. A única possibilidade teria sido já estar assinado um novo contrato com o jogador. Segundo os jornais o Sporting queria subir a cláusula de rescisão para 30 milhões, com um significativo aumento de salário; pelo que veio a lume Nani quereria um salário perto do de Liedson. Na hipótese de este contrato já estar assinado, e caso o MU estivesse disposto a largar os 30 milhões, o Sporting encaixaria mais cerca de 4 milhões. Mas se o MU não cobrisse aquela verba arriscar-nos-iamos a ficar com o jogador mais uma época a ganhar um balúrdio. E com a cabecinha que ele tem, não sei se não seria um grande risco...
A oposição à direcção do Sporting não deve, quanto a mim, ser feita de forma silogística; tipo “a direcção é má”, “a direcção vende”, logo “a direcção vende mal”. A minha oposição não incide tanto sobre factos isolados, esta ou aquela atitude, esta ou aquela medida (embora também me atire a ela quando acho que tal aontece), mas sobre o modelo de gestão e o rumo que a instituição Sporting está a tomar. Como expressei num comentário «a minha oposição ao modo de gerir o Sporting prende-se com o rumo que FSF parece pretender para o clube: descapitalizar este em favor da SAD, transferindo para esta o património real (estádio, Academia) para tornar mais apetecíveis as acções a pôr no mercado; até aos 51% numa primeira fase, para depois convencer os sócios de que o controlo é possível com uns trinta e tal por cento, assim abrindo a porta a um qualquer camone cheio de papel ou a um russo que pretede fazer uma lavagem de dinheiro».
No caso da venda de Nani não me parece que possa haver dúvidas de que foi um excelente negócio para o Sporting. Como, aliás, é do interesse dos bancos credores, ao serviço dos quais, como sempre tenho dito, pode ser que a direcção do Sporting não esteja; mas lá que parece que está, parece.