terça-feira, 1 de janeiro de 2008

Plano para o novo ano

Este início de ano é um pretexto para fazermos umas continhas que permitirão ajudar a perceber a origem da crise do Sporting.
Nos últimos 25 anos (vinte cinco anos, um quarto de século, um quarto da vida do Clube...) o Sporting ganhou dois campeonatos de futebol. Tivemos os tais sete "títulos" em sete anos que o outro reclamava e tivemos --agora a sério!-- muitos feitos dignos de realce noutras modalidades. Algumas destas modalidades, como o atletismo por exemplo, merecem até mais crédito do que qualquer outra pelos feitos alcançados. Num balanço geral a instituição Sporting Clube de Portugal, no seu todo e no âmbito da dimensão e do papel histórico que tem na sociedade portuguesa, não está desacreditada.
Mas, a realidade é esta: em 25 anos, dois títulos.
Durante este mesmo período o F. C. Porto arrecadou 15 títulos na prova maior do futebol português, ou seja, 60% dos títulos em jogo nestes últimos 25 anos e projectou-se no mundo de forma que não deixa margem para sofismas. O Sporting, esse, atinge mínimos históricos.

Ao longo de todos estes longos anos não encontramos uma orientação uniforme na direcção do Clube. Fomos assistindo a períodos de má gestão, a fases em que imperou a proverbial tendência para o tiro no pé, os erros de casting, o voluntarismo, etc. Todos estes factores pesaram no comportamento desportivo do futebol Sportinguista. Até surgir o advento da chamada "era Roquette". A partir daí podemos distinguir duas outras fases. A fase "Roquette" propriamente dita, marcada por graves erros de estratégia, de gestão e por oportunismos vários, mas também uma fase marcada por uma inequívoca vontade de vencer e de voltar a dar dimensão ganhadora ao Clube, e a fase actual, em que, embora obrigada a ter de lidar com as consequências negativas da má gestão anterior, a direcção optou por apagar do vocabulário verde e branco a palavra "vencer". Joga-se em todos os tabuleiros para a mera manutenção (há um sub-campeonato dos grandes onde o Sporting joga, desde há anos, para não "descer" --a média de classificações demonstra-o sem equívocos), para os mínimos, para ir cobrindo a factura, para evitar a queda fatal, enquanto, no plano internacional, se perde por falta de comparência. Esta é a realidade dos factos.
A estratégia actual poderia ser legítima se víssemos que o Sporting recuperava entretanto forças na retaguarda e se preparava com determinação para um futuro de grande pujança. Mas, a verdade é que o que tem estado a acontecer neste interim é a perda irrecuperável de todo o élan que existia e o desbaratar de forma miserável do nosso património mais valioso: os sócios e adeptos.
Sem vitórias, sem uma dinâmica de vitória clara, o Sporting perde fôlego, perde sócios, perde adeptos, actuais e potenciais, e hipoteca assim as suas fontes futuras de receita. Cada um de nós conhece, certamente, uma mão cheia de antigos sócios que se desligaram completamente do Clube e de adeptos que já nem por desfastio olham para um jogo do Sporting na televisão (1). Todos nós vemos gente nova atraída pelos feitos de outros clubes, que potencialmente poderia ser Sportinguista. Uma situação agora tornada ainda mais dramática com a possibilidade de seguir os melhores campeonatos europeus, onde jogam aliás, para nossa raiva, muitos daqueles que o Sporting deixou escapar das suas fileiras.
O Sporting vive das receitas do futebol e o futebol está em dívida, serve para cobrir dívidas e não pode, tal como está concebido, gerar quaisquer mais valias. Ou seja, a dívida --que só pode ser coberta pelo futebol-- não vai parar de se acumular com esta estratégia de "serviços mínimos" e o panorama não pode senão tornar-se mais problemático. A "salvação", o mito do clube de formação não passa disso mesmo: de uma manobra de propaganda para dar a sensação vã de glória aos resistentes, uma estratégia da qual o Sporting de modo algum poderia, no figurino escolhido, retirar todo o potencial ganho. Os Sportinguistas vibram aliás mais com os êxitos dos atletas oriundos do Sporting do que com os seus actuais atletas.

Diz-se amiúde que o futebol mudou. É verdade, embora nem sempre para melhor (2)... Pois bem, face aos resultados e olhando para estes 25 anos, se o futebol mudou, a única conclusão que podemos tirar é a de que o Sporting não se soube adaptar aos novos tempos. As soluções encontradas em determinada altura, quando a dinâmica do Clube era favorável à criação de uma vaga de vitória, foram incompetentes e, dir-se-ia, quase criminosas. Na actualidade, a estratégia seguida perpetua a tendência de derrota. É uma estratégia mesquinha, desinspirada, rotineira, oportunista e nunca fará o Clube passar da cepa torta.
Esse é o único pecado dos dirigentes actuais. E não é pequeno. Na actualidade, não se consegue vislumbrar senão um horizonte negro para o nosso Clube do coração. Tudo, na verdade, está hipotecado e tudo continuará hipotecado enquanto se mantiver esta estratégia.
Ao dizer isto não estou a retirar nem um micrograma à grandeza do Sporting e não vacilo nem por uma fracção de segundo na minha paixão pelo meu Clube de sempre!
Estou apenas a ser realista.
Na história da Humanidade houve grandes impérios, grandes nações, grandes instituições que foram varridas do mapa. Por vezes foram-no apesar de uma luta feroz para manter a sua grandeza. Mas, não há nenhum grande império, não há nenhuma grande nação, não há nenhuma grande instituição que não tenha de lutar para manter a sua grandeza. A luta é a condição da grandeza e a única realidade que espera quem aspira à grandeza.
O que nunca admitirei em circunstância alguma é que a grande instituição que é o Sporting Clube de Portugal se arrisque a ser varrida do mapa e se resigne a desaparecer sem luta!
Ora aqui está o plano para 2008...



(1) Não nos iludamos com as gameboxes vendidas, nem com as manifestações de júbilo pelos últimos campeonatos ganhos. Tudo isto podia ser dobrado ou triplicado se tivéssemos um Sporting ganhador. O universo Sporting está muito aquém do que poderia ser.
(2) Aliás, dá-me sempre vontade de rir quando ouço esta conversa do futebol ser hoje diferente. Em Portugal, os estádios esvaziaram-se e isso prova que a diferença foi para pior. Aqueles que se resignam perante esta situação deveriam parar para pensar se não há algo de errado no futebol pós-moderno...