segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

"Ideias que não colam"

Tomo a liberdade de me "apropriar" do título da crónica de hoje de Rui Tavares no Público. Esta (mais uma vez, excelente) "crónica sem dor" fala, a propósito do regicídio, da questão das ideias feitas em história que muitas vezes não colam com a realidade. Uma dessas ideias é a de que "existia em 1908 um país real, que é o da província que não se interessava por política, e um país artificial, que era o dos cafés de Lisboa, onde se discutiam ideias artificiais vindas do estrangeiro."
"Se as ideias novas são artificiais e o país real não muda, conclui-se que as alterações de regime são sempre deploráveis porque interrompem o curso natural das coisas," observa Rui Tavares.
Numa palavra, os partidários do regime monárquico argumentam afinal, para defender a sua dama, que D. Carlos (como a minha avó) se não tivesse morrido ainda estaria vivo... D. Carlos, não fora o regicídio, teria transformado Portugal numa espécie de Inglaterra, "liberal, mas amante da ordem." Ora, "tomar os regimes pelo fim não nos permite explicar uma coisa, ou pelo menos reflectir sobre ela," alerta o cronista. "[O] reinado de D. Carlos I (que durou 20 anos) [teve] tempo mais que suficiente para evoluir 'naturalmente'. (...) Pelos vistos, pretende-se que os regimes não evoluem para sociedades abertas por culpa das oposições - e não da cegueira dos próprios regimes ou do egoísmo das elites que beneficiavam deles." Uma ideia que, como conclui Rui Tavares (e nisso estou de acordo com ele), "não cola."
Ao ler as palavras do cronista não posso deixar de pensar no Sporting. Perdoem-me e perdoe-me, sobretudo, o Rui Tavares... Esta associação de ideias não deixa de ser irónica porque o que desde sempre advogo é um Sporting seguidor fiel dos seus princípios fundadores, da ordem portanto...
Mas, vejo na maneira como a crítica (nem falo de oposição!) é tratada, na cegueira e no egoísmo que as elites que beneficiam deste regime ditado por esta "monarquia" esfandongada que domina desde há mais de uma década as instâncias de poder no Sporting, vejo no próprio advento da crítica, nos termos e no tempo em que emerge, traços que me fazem pensar que também o que se passa hoje no Sporting não cola com a realidade daquilo que os Sportinguistas (creio que na sua maioria e gostaria que uma eleição permitisse provar isto de uma vez por todas!) desejam para o seu Clube.
É portanto de uma questão de regime e não de uma ocasional e transitória reforma deste ou daquele procedimento que estamos a falar quando advogamos a mudança. Quem tem então medo de uma mudança de regime no Sporting? E quem é que não quer a mudança?
Qual é o Sporting real neste ano de graça de 2008?
Já agora..., ontem, ao mesmo tempo que no futebol encaixávamos mais uma derrota no Restelo, as equipas de atletismo do Sporting renovavam o título nacional de pista coberta. Não sei se alguém deu por isso. Principalmente os inquietos situacionistas do costume...

6 comentários:

  1. Estimado,
    Admirável símile.
    Atletismo, dos poucos desportos em que o árbitro tem pouca influência nas decisões finais, conquistamos novamente, o título de campeões em masculinos e femininos, quanto ao Restelo é mais um clímax de um acto de uma ópera, a obra contínua, e, os clímaxes sucedem se, a dinastia Roquette vive e trabalha ao serviço de uma corte que teima em dizer que os compromissos são para cumprir.
    Será que no atletismo o SCP tem mais recursos que os adversários?
    Não, a diferença está em quem comanda.
    Parabéns Moniz Pereira, és um verdadeiro Leão.
    Saudações Leoninas

    ResponderEliminar
  2. Agradecimentos sinceros!
    Já me tinha perguntado por onde andarias... (creio --por que por estas bandas a gente não pode saber ao certo-- que és o Rui... Rui não é verdade?)
    Por coincidência, ontem o meu caríssimo companheiro aqui do blog Leão Verde (existirão de outra cor?) perguntava como será quando o Professor desaparecer. Que fique connosco muito tempo, a questão não é naturalmente essa, mas a pergunta perturba...

    ResponderEliminar
  3. Não concordo nada com o artigo do Rui Tavares. Aliás nunca concordo com ele, ponto final. A Rui Tavares só faltou homenagear os regidas.

    Nenhum monárquico alguma vez afirmou que Portugal no tempo da Monarquia era um mar de rosas (e agora é?). D. Carlos pagou com a vida a falta de competência e a má fé da classe política da época. Tomara ele que pudesse ser apenas uma figura "decorativa". Não podia e foi feito bode expiatório. Por isso mataram-no, mas o que se lhe seguiu foi muito pior, porque simplesmente há uma coisa que é indiscutível: República não é sinónimo de Democracia e Liberdade. Não foi por causa de D. Carlos e da Monarquia que Portugal teve de passar pela I e II Repúblicas. Esses regimes são da responsabilidade dos republicanos. E durante os mesmos houve muito mais violência, censura, repressão que durante a Monarquia Constitucional. Isto são FACTOS. Se fura o "barato" à esquerda, azar. Vão ser irónicas as comemorações da implantação da República. Comemorar um dos piores períodos da História de Portugal, o que se seguiu ao 5 de Outubro de 1910 (quem consultar a imprensa estrangeira da época tem uma ideia do retrato que se fazia do país lá fora, sendo Portugal tido como a Turquia da Europa Ocidental, ao contrário da glorificação do regime que se fazia e faz cá) numa altura de decadência económica e social faz todo o sentido. Junta-se a fome à vontade de comer.

    Quanto ao Sporting, mais uma vez discordo do termo usado. Porquê a comparação com a Monarquia?? No tempo da Monarquia Constitucional havia pluralismo político e ideológico (alguém que experimente caricaturar o Sócrates ou Cavaco como se fazia com o D. Carlos, para ver o que lhe acontece...). Na I e II Repúblicas é que havia um sistema de partido único. Porque é que não se usa esse paralelismo? Não vos convém? Lamento, mas factos são factos.

    O Sporting tem eleições, mas não há verdadeira escolha, porque na maior parte das eleições só há uma lista. Logo, não se trata de uma "monarquia" instalada no clube, mas sim de défice democrático. E não é de há 12 anos para cá, é desde sempre, porque são raros os actos eleitorais em que se candidata mais de uma lista. Culpa das suas elites e bases, portanto.

    ResponderEliminar
  4. Parece que temos aqui uma contenda entre historiadores, já percebi...
    Isso vai para aí uma grande confusão ó Lionheart!
    Lamento, mas eu apenas usei o artigo do Rui Tavares como pretexto para ilustrar um argumento. O facto de concordar com ele ou não é irrelevante.
    Não defendi nem ataquei a monarquia ou a república, nem estou a fazer teoria sobre a monarquia ou a república. Nem é esse o propósito aqui no KL. Foi apenas uma metáfora.
    O que me move aqui é o Sporting.
    E o que eu disse --e a ideia que defendo desde há muito nestas páginas-- é que há um "regime" instalado. Nesse sentido é que comparei o argumento do Tavares com a questão Sportinguista. A monarquia não é para aqui chamada.
    Quando ele escreve que se "pretende que os regimes não evoluem para sociedades abertas por culpa das oposições - e não da cegueira dos próprios regimes ou do egoísmo das elites que beneficiavam deles" o argumento parece aplicar-se ao que umas súbitas boas consciências sportinguitas vêm ultimamente apregoando contra muitos críticos do Sporting...
    Não é só aqui no KL, é noutros blogs do Sporting. Há para aí umas consciências tardiamente acordadas que acham que criticar é feio...
    Neste últimos tempos, parece que estes situacionistas (defensores do status quo Sportinguista) só sabem argumentar que a oposição é que é a responsável pelo actual estado de coisas. Criticamos e portanto somos nós que temos a culpa de tudo o que de mau se passa no Sporting.
    Ora isso é um disparate sem classificação.
    Os cheques do Sporting são assinados pela direcção ou é a oposição que os assina?
    Não é a oposição que é responsável pelas escolhas de pessoas, pela criação de cargos, pela organização, pela definição de objectivos e pela sua implementação prática. E não é a oposição que é responsável pela degradação do Sporting e pela ausência de resultados.
    Não é a oposição que é cega e egoísta (eu acrescntaria e oportunista). É o regime.
    Também isto são factos, ou não?
    Por outro lado, se há um défice democrático e "não é de há 12 anos para cá, é desde sempre", isso é mais uma razão para lutar, ou não? E se há um défice democrático é porque há um regime instalado, ou não?
    Ou você tem dúvidas que as "elites" sportinguistas estão mergulhadas na cegueira e no egoísmo?!
    Enfim, creio que esta conversa terá pano para mangas. Não vejo estas questões debatidas em mais sítio nenhum. Agradeço-lhe a sua argumentação com toda a sinceridade e permita-me que lhe diga que fico particularmente satisfeito por a podermos ter aqui.
    O KL é de facto um espaço diferente... Como o Sporting :-)

    ResponderEliminar
  5. OK, Master Lizard. Estás "perdoado". ;) O que se passa no Sporting é um esgotamento de protagonistas. O escol dirigente nunca mais se renova e o clube não recupera por causa disso. Esta geração do projecto Roquette está esgotada. Não tem dinamismo, ideias, vontade, ou capacidade de luta. É necessário alternância no poder. Isto é básico numa democracia. Como temos um défice democrático, o clube está em decadência. Quero acreditar que há massa crítica no Sporting para dar a volta a isto. Mas penso que ainda vamos assistir ao estrubuchar desta gente que lá está, antes de aparecer uma alternativa de poder, porque ainda há muitos sócios agarrados ao dogma de que o clube está bem entregue à oligarquia, como se eles fossem dirigentes naturais do Sporting, por causa dos seus antepassados. Será traumático para muita gente reconhecer o falhanço dos "herdeiros" dos fundadores.

    Mesmo com o falhanço notório da geração Roquette, a passagem de testemunho no Sporting não será feita sem uma GRANDE turbulência interna, acredita. As divisões actuais são só um mero prenúncio do que aí vem. Mas não há mudança sem dor, e o Sporting precisa de uma rutura. Também precisa de união, como de pão para a boca, mas não são os actuais dirigentes que podem unir os sportinguistas. Pelo contrário, procuram dividi-los para permanecer no poder. A este propósito, note-se as recentes "infiltrações" em alguns blogues críticos do "regime", no sentido de abafar as críticas. Gostava de ver os IP's de algumas contribuições para blogues como "O Sangue Leonino", por exemplo. Suspeito que há gente muito activa na blogosfera a partir do Visconde de Alvalade...

    ResponderEliminar
  6. Ora bem! Não quero ferir susceptibilidades a ninguém.
    Penso que segues o que aqui vamos escrevendo, portanto sabes que estamos de acordo quanto à questão do défice democrático e sobre a necessidade de união. São questões sobre as quais temos falado aqui.
    E também não tenho dúvidas sobre a turbulência...
    E, finalmente, não tenho tão pouco dúvidas que o 7º andar anda agitado. Mas, eu também os vejo daqui com os meus binóculos...

    ResponderEliminar

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.