domingo, 24 de fevereiro de 2008

Casa de espelhos

Recentemente, surgiu uma série de iniciativas com origem no universo Sportinguista que merecem toda a atenção e respeito. Destaco a União dos Blogues Leoninos, uma iniciativa do blogue O Sangue Leonino, que conta já com cerca de uma dúzia de adesões, o Leão de Verdade, movimento criado em torno do "Manifesto SCP Mais e Melhor Sporting" e, mais recentemente, a iniciativa “Pensar Sporting!” dinamizada pelo grupo Ofensiva 1906.
Confesso que tenho sentimentos contraditórios em relação a todas estas iniciativas. É justo sublinhar que, por um lado, o que tudo isto revela, em primeira análise, é um grande dinamismo, um grande fervor clubístico, uma grande vontade de particpação na causa Sportinguista e um assinalável espírito de inciativa. Espelham também um louvável desejo de acção e um cansaço com a retórica que é de saudar. Raramente se vê na sociedade portuguesa um empenhamento colectivo deste género. Por aí o Sporting está a dar 100-0, não só aos rivais, mas também às outras associações, desportivas ou não, e estruturas democráticas do país. Se o que se observa no Sporting fosse a regra, teríamos certamente um país mais solidário e uma intervenção dos cidadãos bem mais participativa. O que se passa no Sporting hoje deve, em particular, merecer uma atenção especial dos políticos. Os Sportinguistas não andam a dormir e querem demonstrar que não estão dispostos a deixar a resolução dos seus problemas em mãos alheias. Perante os apelos que recentemente até o mais alto dignitário do país fez aos portugueses, aqui está um exemplo (que devia ser exibido!) de um fortíssimo sentimento contra a resignação...
Mas, (e há sempre um mas...) todos estes movimentos me deixam também um pouco preocupado. No meio do fervor temos de ver que terrenos andamos a pisar. Podem estar armadilhados...
O Sporting é uma instituição centenária que foi fundada com base em determinados princípios que estão hoje consignados de forma clara nos seus Estatutos. O Sporting não é uma associação de jeitosos feita em laboratório, nem provém de nenhum ensaio clandestino feito em proveta. O Sporting é uma instituição, legal, com orgãos de poder eleitos, com regras de funcionamento aprovadas de forma democraticamente irrepreensível, com uma legitimidade histórica acrescida e com um peso considerável na sociedade portuguesa.
Volta não volta, uns quantos aventureiros tentam tomar conta do curso dos acontecimentos. Mas, os Sportinguistas têm sabido reagir. As eleições são isso: reacção! A dinastia Roquette e a actual direcção são isso: reacção!
O modus operandi do Sporting vai, mas os princípios do Clube ficam. Sucedeu isso com anteriores direcções e vai suceder isso com esta, com toda a certeza.
Ora, quaisquer iniciativas para mudar o curso dos acontecimentos no Sporting têm de ser tomadas à luz do sistema de funcionamento legal do Clube. Não é isso que está a suceder.
Não quero dizer com isto que não haja intervenção, bem antes pelo contrário. Quero dizer é que face a esta realidade que é a capacidade de intervenção dos Sportinguistas se constata que a fórmula organizativa do Clube não satisfaz e que os Estatutos já não refletem essa mesma realidade. Há pois que pugnar pela mudança dos Estatutos.
Já há muito tempo que propus a criação de um orgão regulado estatutariamente que permita uma maior intervenção dos Sportinguistas na vida do Clube. Uma espécie de Senado, de Assembleia, de Conselho, como lhe queiram chamar, com poder deliberativo, não este Conselho Leonino que é um travesti de democracia! É isso que, na minha opinião falta. Uma organismo que reflita a pluralidade dos Sportinguistas, mas que garanta a sua unidade num quadro de absoluta legitimidade das suas iniciativas. A realidade actual diz-me que esta ideia está correcta. Este é o programa para uma candidatura!
A impossibilidade de intervir gera descontentamentos e feridas insanáveis no seio do universo Sportinguista. O erro principal do "projecto Roquette" foi não ter incorporado a intervenção dos Sportinguistas nos seus planos, depois de ter metido o Sporting por novos caminhos, sobretudo, no plano da sua reorganização "comercial". Os resultados estão à vista.
Mas, estas inicitiavas, que agora vêem a luz do dia, por muito louváveis que sejam, sem desprimor para os seus proponentes e sem colocar em causa a bondade da sua criação, não podem gerar o contrário: intervenção dos Sportinguistas sem regras! Desta forma arriscamo-nos a ter um Sporting tipo casa de espelhos, em que para onde quer que nos viremos, vemos milhentas realidades refletidas nas paredes e não sabemos a origem dos objectos que refletem essas imagens...
Ao lançar todas esta iniciativas os seus autores têm de estar conscientes que estão provocar clivagens, que têm de ter uma qualquer resolução no seio do Clube. De outra forma arriscamo-nos também a ter um Sporting 1, um Sporting 2, ou 3 e por aí fora. O louvável poder de iniciativa demonstrado pelos Sportinguistas não pode servir para escaqueirar ainda mais a unidade necessária.
O objectivo é entendermo-nos todos, não destruir o UM que é o Sporting, nem substituir uma elite por outra! Para elites já dei...
Temos de enquadrar todas as inicitivas, de todos os legítimos grupos de sócios num quadro de regras sem mácula.
E há, finalmente, que distinguir também muito claramente uma outra coisa: eu não sou adepto do Sporting! Eu sou sócio do Sporting! Os adeptos que se organizem. A mim cabe-me participar na vida do Clube no quadro definido pelos seus Estatutos.
Fá-lo-ei sempre, se me deixarem, se quiserem contar com a minha opinião e se existirem mecanismos que o permitam fazer.
O pior é se eu continuo a pagar as quotas e não me deixam dar, ou não querem que eu dê a minha opinião porque há sempre uns iluminados que decidiram que sabem mais do que eu...

12 comentários:

  1. Pois. O que eu queria mesmo era uma lista alternativa forte em 2009, que mobilizasse os sócios e invertesse o declínio do clube. Isso é que eu queria. Porque congressos e seminários não mudam o essencial. Com isso pode o status quo muito bem...

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  2. Uma lista alternativa com um programa concreto: mudar os Estatutos!

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  3. Lionheart, concordo. Mas os congressos/seminários ou AG podem ter um mérito - mesmo que daí não resultem imediatamente soluções estruturadas para o clube, vão alertar os sportinguistas para a necessidade e vontade de mudar.

    Aliás, penso que uma parte dos problemas actuais do clube advém do curto espaço que houve para a criação de listas alternativas e discussão de ideias nas últimas eleições. Disso se aproveitou o status quo de que falas...

    João Mineiro

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  4. Caro João,
    Há uma diferença enorme entre um congresso/seminário e uma AG. A AG é um orgão de poder do SCP não é uma organização para debater ideias.
    Eu não sou contra as iniciativas de esclarecimento e debate de ideias entre os sócios do Sporting. Muito pelo contrário! O que temos de ter em atenção é esta questão, simples mas fulcral: estes debates têm de ser inclusivos.
    Eu luto por um Sporting dos sócios.
    E luto contra a indiferença e o abandono.
    Já há muito tempo que sugeri uma outra campanha que pode substituir ou desenrolar-se paralelamente à campanha dos novos sócios: a campanha dos velhos sócios que abandonaram o Clube há muito.
    Não são assim tão poucos como isso. Afastaram-se por um bom motivo e era bom que se aproximassem por um bom motivo também.

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  5. O problema das alternativas é que a Hidra seca tudo o que lhe aparece pela frente. Já temos o Betencourt e o Telles a chegarem-se à frente. Neste últimos dias descobrimos que o Abrantes Mendes agora apoia uma potencial candidatura de Ernesto Ferreira da Silva e dois dias depois o blog Centúria Leonina dá ainda a palavra a mais um dos responsáveis pelo estado de coisas a que as coisas chegaram: Rogério Alves. No meio disto tudo a única solução era aparecer uma alternativa credível que unificasse a oposição ao Projecto Roquette e que as as lutas de poder entre a descendência deste levasse a que se multiplicassem as candidaturas dos defensores da situação.
    O problema do seminário ou de um eventual congresso é o mesmo que vimos agora com Abrantes Mendes e com Rogério Alves. Os potenciais organizadores destas iniciativas mais do que criar movimentos de reflexão autónomos e que procurem não só escutar como consolidar as diversas correntes de opinião que existem entre os sócios e adeptos, procuram antes de mais assegurar a sua própria notoriedade e a sua inscrição no campo do poder ao trazerem imediatamente para o debate figuras institucionais que mais uma vez vão tentar secar qualquer manifestação de vida da "sociedade civil" leonina.
    Para terminar, dizer que aguardo ansiosamente pelo chorrilho de banalidades e lugares comuns que vão amanhã ser debitados no lançamento da campanha de angariação de novos sócios, ou seja, na campanha de angariação de mais uns patos a quem se podem sacar uns trocos todos os meses.
    Ou muito me engano ou vão apresentar a coisa num mix de marketing viral e responsabilidade social, cheio de buzzwords e muito benchmarking.

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  6. Caríssimo Luizinho,
    Inteiramente de acordo. Gosto do comentário, mesmo!
    Relativamente às dúvidas que levantas, que também subscrevo, só tenho uma coisa a dizer: há que lhes dar combate!
    E há que gritar: ética Sportinguista, precisa-se!!
    Ética! Ética!! Ética!!!!
    A questão que se coloca relativamente aos putativos candidatos é exactamente a mesma que se coloca em relação aos "comentadores" oficiais do Sporting; aquela gente que aparece sempre nos jornais e televisões a falar sobre o Clube e a "empochar" o deles à pala. Poderíamos dizer que andam a chular o Sporting, ou será politicamente incorrecto...?
    Temos de colocar a discussão sobre o Sporting num plano tal que leve esta gente a ter de revelar o que faz e o que fez pelo Sporting para que possam ter sequer a veleidade de pensar em representar um qualquer papel no universo Sportinguista.
    Os Sportinguistas têm sido muito permissivos e ingénuos no que respeita aos seus representantes.
    O Sporting precisa de um programa sério e de gente capaz, não de pombos correio, nem de jeitosos. E, sobretudo, o Sporting não pode servir para tirocínio de qualquer aventura futura, nem pode constituir trampolim para qualquer operação de ajuste de contas ou de limpeza.
    O Sporting é o Sporting, não é uma casa de favores.
    E os candidatos a candidatos a cargos no Sporting têm de se apresentar aos sócios pelos méritos do programa que têm ou que partilham e não por um qualquer direito divino.
    Este modelo do Sporting-Caras é uma cancro execrável que tem de ser extirpado com decisão.

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  7. Exacto. A questão chave é mesmo a do projecto e a ideia será nesta altura de fugir das "caras", das "estrelas" e dos "notáveis" como o diabo da Cruz. Felizmente mesmo dentro da coligação Centúria/Sangue Leonino já há quem tenha vindo por alguma água na fervura. Agora esta aproximação de antigos dirigentes aos blogs não tem outro propósito se não facilitar limpezas de imagem e apagamentos de trajectórias sociais e desportivas, e são ingénuos aqueles que esperam que alguma coisa de bom pode sair desta aproximação. Para o Sporting, claro. Para eles é evidente que a coisa pode resultar.

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  8. Um pouco à margem desta questão (se calhar, não tão à margem...) devo confessar, clarificar e sublinhar, que, ao colocar neste meu post a UBL na lista das iniciativas de origem Sportinguista e ao dar ao meu texto o desenvolvimento que dei, poderei estar a transmitir a imagem (errada) que meto tudo no mesmo saco.
    Não meto!
    Por amor à verdade, devo dizer que acho que a UBL pode mesmo vir a ser o que de mais genuíno e importante podemos encontrar neste lote de iniciativas.
    Eu considero os blogs leoninos como os contributos para o debate Sportinguista mais puros, generosos e valiosos que jamais surgiram. Os blogs quase fazem lembrar a pureza dos fundadores do nosso Clube.
    Os blogs têm força, são cada vez mais lidos, há frequentemente neles matéria substantiva de enorme valor (quer no plano da discussão sobre o Clube, quer no plano da discussão desportiva), são livres (tanto quanto me apercebo...) e incomodam.
    O incómodo que causam, creio, está na razão directa dos temas que abordam, da dor que provocam e do seu carácter acutilante. Hoje, ninguém com dois dedos de testa poderá ignorar o que por aqui se vai dizendo.
    Teremos vantagem em criar uma UBL mesmo muito unida (passe o pleonasmo!), verdadeiramente livre e poderemos colher benefícios ao tirar cada vez mais partido desta arma, usando todas as ferramentas ao nosso dispôr.
    Esta "democracia electrónica" tem vindo a provar que é vital neste momento do Sporting. Hoje os blogs são uma poder.
    Mas, temos de nutrir esta flor delicada e tratá-la com pinças, sem caír nas tentações que levaram ao descrédito das instituições e das personagens que hoje criticamos.

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  9. Também a mim estas iniciativas provocam sentimentos contraditórios, e incluo aqui a UBL. No lado das vantagens, e penso que este é o ponto fundamental de todas estas iniciativas, temos o facto de que as vozes isoladas que de outra forma não se poderiam fazer ouvir em sede e Assembleia Geral já terão um maior poder reivindicativo e organizativo nas próximas reuniões magnas, permitindo a uma série de pessoas que falem em nome próprio mas também em nome de colectivos mais amplos. Ainda neste quadro penso que a "democracia electrónica" do Sporting apresenta característica inovadoras em relação ao que temos assistido noutras esferas de actividade, nomeadamente a possibilidade de uma intervenção efectiva na vida do clube. Os blogs do Sporting estão de facto a agregar pessoas numa lógica de acção que ultrapassa o habitual nos meios de comunicação de "antena aberta", no sentido em que não se limitam a servir para canalizar descontentamentos sem que isso frustre uma prática reivindicativa nas sedes apropriadas. No lado negativo, e associado às lógicas da própria filiação clubística em Portugal (que não remetem para uniformidades políticas e sociais como acontece noutros países) leve a que um conjunto bastante heterogéneo de pessoas procure lógicas de acção colectiva que tenderão a fracassar pela sua própria natureza heterogénea. O problema fundamental aqui é como evitar que a união não acabe por calar as vozes mais heterodoxas, não somente pelo efeito de censura mas também pela autocensura a que cada um se impõe.

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  10. Inteiramente de acordo meu caro! É aliás nesse sentido que falo em refletir a pluralidade com garantia de unidade, mas num quadro estatuário que seja aceite por todos. Por isso é que falo de alteração dos Estatutos.
    Creio que só prevendo um mecanismo que permita o exercício do direito à análise e à livre expressão das ideias é que esses riscos de de censura e de auto-censura poderão ser anulados. Por outro lado, esse mecanismo facilita a participação.
    Muita gente não participa na vida do Clube, afastou-se e afasta-se porque não sente que possa ter voz activa.
    É de facto aí que está o segredo.
    De outro modo, o Sporting corre o risco de se transformar numa coisa qualquer, incaracterística, sujeita a critérios de moda (já acontece de certa forma hoje...) ou aos ditames do "mercado", tenderá a desagregar-se, ou mesmo a desaparecer.

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  11. Caríssimos, partilho das Vossas preocupações e vou tentar ser breve pois o adiantado da hora não me permite alongar.
    A UBL tem uma grande vantagem de ser, permite uma exposição superior na blogosfera leonina que de outra forma não existia. É a natureza da sua exposição de conteúdos que se define a si própria. Se o objectivo é lançar alertas sobre a realidade do clube e soluções que permitam a resolução dos problemas com que este se depara, seria contraproducente calar as mesmas vozes que a alimentam. A meu ver, a UBL deve ser sempre um espaço de critica construtiva onde não prevaleça nenhuma linha editorial mas sim, uma voz que encontre os denominadores comuns dos seus participantes.
    Abraço de Leão,
    Verdão.

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  12. Temos de encontrar uma sede e um formato "electrónico" para a UBL. Um meta-blog, se vocês quiserem que reflita os nossos blogs comm valor acrescentado. Não é um (mais) um "portal" de blogs leoninos, mas um meta-blog!
    Uma ideia a discutir e amadurecer...

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